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Um Senado sem poder

Decisão de Gilmar Mendes mantém exigências elevadas para impeachment de ministros e evidencia a fragilização institucional do Senado

17/12/202517:06

O ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu, após um humilhante pedido do Senado, suspender parcialmente a liminar por ele proferida sobre a aplicação da Lei do Impeachment nos casos envolvendo os ministros da corte. Também retirou da pauta de julgamento o processo, incluindo-o em sessão de julgamento presencial. De resto, manteve tudo como estava antes, suspendendo apenas dois pontos de sua decisão original, permanecendo a exigência do apoio de dois terços (54) dos 81 senadores para a abertura do processo de impeachment, e não mais a maioria simples (41 senadores).

Foto Um Senado sem poder
Foto: Ilustrativa/Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil/Arquivo

O argumento utilizado foi a proteção e a independência do Poder Judiciário. Manteve também a proibição do afastamento de um ministro na fase intermediária do processo, que é quando o plenário do Senado aprova a admissibilidade da denúncia. Praticamente tudo ficou como antes no quartel de Abrantes.

Em sua análise, Gilmar considerou o avanço das discussões no Senado sobre a aprovação de uma legislação atualizada para disciplinar o processo de impeachment de autoridades. Só mudou sua decisão depois que lhe apresentaram o projeto sobre as regras do impeachment. Segundo ele, o novo texto incorpora elementos da liminar e evidencia um esforço de cooperação entre as instituições, guiado pela prudência, pelo diálogo e pelo respeito às normas constitucionais.

“Tal aprimoramento legislativo não se limita a atender formalmente às determinações do Supremo Tribunal Federal, mas configura ato de elevado espírito público, voltado à preservação da integridade do Poder Judiciário e à proteção da harmonia entre os Poderes.”

Em sua nova decisão, Gilmar considerou que:

“Nesse contexto, entendo que o profícuo debate legislativo em curso evidencia a possibilidade de acolhimento parcial das demandas formuladas pelo Senado Federal. No âmbito do Parlamento, a questão relativa à legitimidade para a apresentação de denúncia por prática de crime de responsabilidade por membros do Poder Judiciário ganhou, após a decisão que proferi, contornos próprios, merecendo exame cuidadoso e aprofundado pelos membros do Congresso Nacional.”

Em sua decisão anterior, Gilmar anulou, praticamente, a Lei nº 1.079/50, que define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento das autoridades. O novo texto apresentado pelo Senado altera somente uma parte da liminar inicial, preservando o restante para concluir a análise do projeto que atualiza as normas de responsabilização de autoridades.

O Senado só pode fazer a análise do projeto sobre o assunto porque Mendes assim decidiu. Caso contrário, estaria proibido de fazê-lo. Mesmo assim, Gilmar só suspendeu, em parte, a sua decisão porque o Senado lhe informou que o projeto de lei destinado a atualizar o processo de impeachment avançou na Comissão de Constituição e Justiça e incorporou a maior parte contida na liminar do ministro.

No mais, o texto original permanece com as salvaguardas institucionais para preservar a independência do STF, os filtros destinados a evitar processos de impeachment motivados por pressões políticas e os parâmetros constitucionais voltados à proteção da separação dos Poderes:

“Entendo ser imprescindível a sua manutenção… sobretudo como instrumento de proteção à independência do Poder Judiciário.”

A Casa Legislativa comunicou que o avanço do PL 1.388/2023 trouxe “fato novo e relevante” após a liminar inicial, e que havia necessidade de suspender o ponto referente à legitimidade para denúncia a fim de concluir o debate legislativo sem conflito com as regras fixadas pelo STF.

No episódio, o Senado saiu enfraquecido, pois quando um ministro, sozinho, decide legislar em benefício próprio e modificar uma lei que funcionou perfeitamente por 75 anos, sem contrariar a Constituição e sem encontrar resistência no Legislativo, é porque a corte não está à altura da sua representação.

Ao aceitar de cabeça baixa a legitimação da blindagem do Judiciário, pelo receio de que a direita possa conquistar a maioria significativa da Casa em 2026, o Senado confirma o que disse Orwell ao mostrar que não é o poder que destrói princípios, mas a ausência de limites, de debates e de vigilância.

Gilmar reescreveu a Lei 1.079/50, criando não apenas uma desigualdade gritante em relação ao impeachment dos ministros, mas blindando a si mesmo e a seus colegas de qualquer possibilidade de impeachment, independentemente dos excessos que cometam.

Luiz Holanda

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Luiz Holanda (ou Luiz de Holanda Moura) é um reconhecido jurista, professor universitário e advogado baiano, com vasta experiência em gestão pública e ensino jurídico. É autor de livros e artigos, além de ter sido conselheiro da OAB/BA e ocupado cargos importantes na administração pública.